quinta-feira, 3 de maio de 2012

Opinião: "O tiro que o Pingo Doce disparou à cabeça do 1º de Maio", por Nuno Filipe Alpoim

O tiro que o Pingo Doce disparou à cabeça do 1º de Maio
por Nuno Filipe Alpoim

 
Fonte: blogue "goodandgone"

Tenho ouvido várias conversas em que pessoas se confrontam, criticando-se mutuamente, relativamente à forma como reagiram ao tiro na cabeça que o Pingo Doce deu ao 1º de Maio!...

Para memória futura, se é que alguém se esquecerá (não vá isto tornar-se moda), que fique registado que o Pingo Doce, tal como outros, cometeu o erro ético de abrir portas no 1º de Maio de 2012 e, além disso, ofereceu um desconto de 50% em compras superiores a 100€, tendo originado uma corrida brutal às compras, a que terão aderido, provavelmente, milhões de pessoas, que esgotaram muitos stocks (produtos de necessidade e produtos superfluos), o que provocou, além de sobrelotação, confrontos físicos e morais que puseram em risco clientes, trabalhadores, transeuntes e forças de segurança da Polícia (que, dada a necessidade de intervenção, originou despesa ao Estado, não sendo este sido ressarcido pelos responsáveis: o grupo Jerónimo Martins).

O que podemos esperar no futuro? Happy hour de lagosta à hora da Consoada?

Seguindo as ideias que escrevi no primeiro parágrafo, terá sido esse um dos principais objetivos do grupo Jerónimo Martins: dividir (o povo) para reinar, o que é a mais antiga e uma das mais eficazes estratégias de dominação que existem. Atiraram o povo às feras, tal como (como li num blogue), os turistas ingleses, na Madeira, atiravam uma moeda ao mar para verem as criancinhas correrem risco de vida a atirarem-se às ondas, lutando por ela.
E, agora, dividem o povo, que, como era previsível, em vez de, independentemente da atitude de cada um, discutir o acontecimento em si, as motivações do mesmo e o nível de ética que dele decorre, discute e embrenha-se numa luta não tens ética porque foste ao Pingo Doce no 1º de Maio VS não tens ética porque só não foste porque não precisas e não respeitas quem precisa, fazendo esquecer a (sobre)exploração a que são votados muitos trabalhadores de superfícies comerciais (e NÃO colaboradores... Trabalhadores esses, em nome de quem o grupo Jerónimo Martins já se tinha arrogado a escrever um comunicado, aquando da fuga para a Holanda), fazendo esquecer o 1º de Maio, fazendo esquecer direitos básicos dos cidadãos e fundamentais da Democracia.

E, já agora, há relatos que alegam que o Pingo Doce aumentou os preços na semana que anteceu o 1º de Maio (situação que não posso confirmar e, portanto, à qual não me vinculo), o que, aliado à falta de concorrência existente em Portugal no setor da distribuição, que garante ao Pingo Doce (e ao Continente) um poder desmedido no mercado, permitindo-lhe alegadamente fazer tais "promoções" à custa dos produtores e demais agentes a montante, que são, esmagados completamente nas suas margens, arcando estes com os custos destas promoções (são célebres os casos dos produtores de leite).

Discuta-se, mas atente-se sobretudo no facto originário de todo o rebuliço. Faça-se mais juízos de valor sobre o facto originário e menos sobre a atitude do amigo ou do vizinho. Não deixemos que entidades absolutamente privadas e sem legitimidade democrática, como são os grupos económicos, nos dividam para reinar. O papel delas é funcionarem no seu mercado, segundo regras que existem (e outras que deveriam existir), assumindo um papel ético.


A cada elemento do povo cabe uma atitude crítica (não obrigatoriamente negativa), que se pretende baseada em factos e tratada em termos de raciocínio com coerência e ética, e cabe também a promoção e a aplicação de atitudes conducentes à sua união (não hegemonia de opiniões, mas tolerância de opiniões e união independentemente das mesmas) em prol duma vida justa e ética, em comunidade e, consequentemente, ao nível individual.

Viva Portugal!